Foi o que afirmou Francisco Dal Chiavon, presidente da Unicopas, durante ato público em defesa das organizações da sociedade civil; dados revelam que, no Brasil, há estoque de arroz para apenas um dia de consumo
“Estamos em meio a duas pandemias: a da Covid-19 e a do capital que, dia após dia, se apossa de toda a renda da sociedade brasileira para acumular nas mãos de meia dúzia de pessoas”, disse o presidente da Unicopas (União Nacional das Organizações Cooperativistas Solidárias) Francisco Dal Chiavon, mais conhecido como Chicão, ao iniciar a fala durante um ato público em defesa das organizações da sociedade civil (OSCs).
Promovido pela Frente Parlamentar Mista em Defesa das Organizações da Sociedade Civil (FPOSC) com o objetivo de dar visibilidade para ações sociais e prestação de serviços realizados durante a pandemia por diversas instituições em todo Brasil, o ato contou com a participação de diversos parlamentares e representantes de diferentes organizações, dentre elas a Unicopas. O deputado federal Afonso Florence, presidente da Frente, destacou a importância do ato para o fortalecimento das organizações. “Este é um ato de apoio às organizações da sociedade civil neste momento de ataques, visando não só fortalece-las, mas defender a aprovação do Projeto de Lei (PL) 4113/2020, a prestação dos serviços sociais na pandemia e o tratamento tributário para as ONGs”, explicou Florence. O PL 4113/2020, introduz normas de caráter transitório aplicáveis a parcerias celebradas pela administração pública durante o período de calamidade pública.
Mas por que é preciso fortalecer as organizações da sociedade civil?
A resposta está na prateleira dos supermercados. Nos últimos dias o país vem acompanhando o aumento expressivo no preço dos alimentos. O arroz, item fundamental da cesta básica das famílias brasileiras, teve um aumento de 100% nos últimos doze meses, segundo levantamento feito pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP. Um pacote de 5 quilos de arroz, por exemplo, chega a custar R$ 40 em algumas regiões do Brasil.
Segundo Chicão, o resultado é consequência das políticas iniciadas ainda em 2016, em que o foco da produção agrícola está centrado, basicamente, na exportação de quatro produtos: milho, soja, algodão e café. “Agora, ainda querem colocar a culpa no aumento dos preços no auxílio emergencial do povo, mas não dizem que o estímulo da produção de alimentos para o abastecimento interno, que é produzido essencialmente pela agricultura familiar, foi abandonado. Qual o resultado? Não temos mais estoque de alimentos no Brasil e isso faz com o que os preços para o nosso povo consumir aumente”, explicou.
Dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) de julho deste ano, por exemplo, mostram que o estoque existente de arroz não garante um dia de consumo nacional. Já o feijão está com estoque zerado.
A falta de estímulo à agricultura familiar – responsável pela produção de 70% dos alimentos para abastecimento interno – pelo atual governo, em especial, em tempos de pandemia, fica nítida quando o PL 735/2020, convertido na Lei nº 14.048, de 24 de agosto de 2020 (Lei Assis de Carvalho), foi vetado pelo Presidente Jair Bolsonaro quase que em sua totalidade. Sancionada com vetos no dia 25 de agosto, o projeto previu um Plano Emergencial da Agricultura Familiar.
Um estudo realizado pelo professor Mauro DelGrossi, da Universidade de Brasília (UnB) revelam os efeitos da pandemia no setor: metade das famílias agricultores familiares teve redução na renda, perdendo, em média, um terço da renda que habitualmente recebiam. Conforme estudo do pesquisador, pouco mais de um terço dessas famílias recebeu o auxílio emergencial. “Sem acesso a recursos, a produção dessas famílias diminui e essa diminuição da produção interna afeta diretamente os consumidores brasileiros”, observou Francisco Dal Chiavon.
Agricultura familiar mostra potencial em ações de solidariedade durante a pandemia
Dados recentemente divulgados pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) revelaram que a fome voltou a aumentar. De acordo com a entidade, 37,5 milhões de pessoas viviam uma situação de insegurança alimentar moderada no país no período entre 2014 e 2016. Entre 2017-2019, porém, esse número chegou a 43,1 milhões. Em termos percentuais, o número também subiu, de 18,3% para 20,6%.
Na contramão dessa realidade, a agricultura familiar reafirma seu papel no combate à fome e a desigualdade no Brasil. Desde o início da pandemia, por exemplo, cooperativas da reforma agrária tem realizado ações de solidariedade nos 24 estados do país. O resultado foi a doação de mais 3.400 toneladas de alimentos a famílias em situação de vulnerabilidade social, em especial, às que vivem nos centros urbanos.
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