Hoje, 7 de junho, celebramos o Dia Nacional de Luta de Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis. Claudete Costa, profissional da catação, atualmente na presidência da Unicatadores, fala, em entrevista especial à Unicopas, sobre a realidade da categoria em tempos de pandemia, estratégias encontradas para superação e perspectivas para o futuro.
Ela, que aos 10 anos conheceu o trabalho nas ruas do Rio de Janeiro, se tornou umas das principais lideranças nacionais da categoria. “A reciclagem é o meu trabalho. É de onde eu tiro o sustento da minha família”.
Confira a entrevista:
U: Hoje, com a pandemia da Covid-19, qual é a situação dos catadores e catadoras do Brasil?
C: Com o isolamento social, da noite para o dia, ficamos impossibilitados de trabalhar. É uma enfermidade que veio para assolar não só o Brasil, mas o mundo. A gente não esperava ter de parar de trabalhar da noite por dia, sendo autônomo, de onde tiramos o nosso sustento. Ter de ficar em casa sem nenhum planejamento foi muito desafiador. Pensar em como se manter e, ao mesmo tempo, pensar em proteger a nossa saúde e a da nossa família.
U: O que vocês, enquanto categoria profissional, têm feito para minimizar esses impactos?
C: Todos nós que fazemos parte do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis começamos a dialogar pelas redes sociais sobre como poderíamos conseguir algum apoio para a categoria, de buscar uma maneira de sobreviver neste momento em que estamos totalmente isolados. Foi aí que surgiu a ideia de fazer a campanha de solidariedade a nível nacional e não somente nos estados e municípios, como vinha ocorrendo. O nosso objetivo é atingir o máximo de pessoas possível para conseguir ajudar o maior número de catadores e catadoras. Para isso precisamos do engajamento da sociedade para que tenhamos condições reais de ajudar o maior número de catadores e catadoras em todo o Brasil.
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U: Os governos têm contribuído de alguma forma?
C: A expectativa era que a nossa categoria pudesse ter sido contemplada com a Renda Básica Emergencial, mas muitos de nós não vai conseguir. Tem o processo de avaliação e eu mesma já recebi resposta de que não vou ser contemplada. Além disso, teve o veto do PL 873/2020, que deixou a situação ainda mais complicada.
Estamos buscando manter, mas está difícil ter um diálogo construtivo com este governo. Muitos parlamentares são parceiros, mas muitos não são. Estamos nos reinventando para sobreviver em um momento tão difícil em que deveríamos ter o total apoio do governo, mas o que nós temos é um cenário de derrocada.
Temos tentado atuar em algumas frentes que são solidárias à nossa causa, como é o caso do PL 1959/2020, da deputada Erika Kokay, que propõe a criação do Fundo Nacional de Emergência dirigida aos catadores de materiais recicláveis enquanto durar a emergência de saúde pública. Nós precisamos desse apoio!
É necessário que as pessoas entendam que nós, catadoras e catadores, temos um papel essencial dentro da sociedade enquanto profissionais da reciclagem. Nós prestamos um serviço para o nosso país. E nós precisamos ser pagos – e muito bem pagos – por este trabalho que desenvolvemos por anos e anos. É como se o Brasil tivesse uma dívida histórica com a gente, catadores e catadoras de cooperativas, de lixão, em situação de rua. Está na hora de mudar esse cenário. Temos parlamentares parceiros? Temos! Mas precisamos avançar mais.
Nós precisamos ser respeitados. Nós somos reconhecidos, mas não somos respeitados. A gente quer reconhecimento com respeito e valorização pelo nosso trabalho. Queremos investimento em nossos galpões. Investimento para termos melhores estruturas de trabalho e a contratação pela nossa prestação de serviço.
U: Quais perspectivas você enxerga para o Brasil no pós-pandemia?
C: Que a gente seja, de fato, um país melhor, mais humano, mais solidário, com mais respeito ao próximo e que valorize mais a mão-de-obra de cada trabalhador e trabalhadora de cada setor, que tem de dar duro para sustentar uma família, colocar comida na mesa e seguir de cabeça erguida dia após dia. Já temos a luta de ter de se manter trabalhando ganhando um salário mínimo, enquanto temos empresas ganhando bilhões fazendo muito menos que a gente. A gente trabalha pela sociedade, pelo meio ambiente, gera trabalho e renda. Eu espero um Brasil de igualdade e respeito à cada trabalhador e trabalhadora que contribui com a economia deste país. Mais respeito para nós!
U: Qual mensagem você gostaria de deixar neste momento?
C: E essa é mensagem que eu deixo para que cada um e cada uma de nós: sigamos de cabeça erguida. Vamos, cada dia mais, buscar e ampliar o nosso conhecimento para poder garantir nossos direitos. Juntos e juntas, somos mais fortes. Cabeça erguida sempre. Recuar, jamais!
Claudete Costa é catadora de materiais recicláveis desde os 10 anos de idade. Com a separação dos pais, a mãe de Claudete teve de ir para as ruas do Rio de Janeiro com três filhos. Vendiam velas de dia e catavam papel durante a noite. Hoje, Claudete ocupa o cargo de presidenta da Unicatadores, uma das centrais do cooperativismo e da economia solidária afiliada à Unicopas, e da Cooperativa Reciclando para Viver.