Seminário realizado no Senado Federal debateu formas de estimular o desenvolvimento sustentável e simultâneo nas áreas ambiental, econômica e social; Agenda 2030, cooperativismo e economia solidária são estratégias essenciais
Inspirado no Big Push Ambiental – estudo realizado pela Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe das Nações Unidas) que analisa possíveis caminhos para um desenvolvimento mais sustentável para a região -, o Seminário Grande Impulso para a Sustentabilidade no Brasil, reuniu, na manhã dessa terça-feira (05), no Senado Federal, parlamentares, líderes nacionais e internacionais, representantes de organizações da sociedade civil, catadores de materiais recicláveis, acampados da reforma agrária, pesquisadores e estudantes.
O objetivo foi debater novas formas de estimular o desenvolvimento sustentável e simultâneo nas áreas ambiental, econômica e social.
Para o senador Jaques Wagner, requerente do seminário, “o maior desafio ao desenvolvimento sustentável, no Brasil, é a desigualdade”. Ele defende a formulação de um projeto de crescimento econômico capaz de garantir a inclusão social e a distribuição de renda a partir do tripé da sustentabilidade: as dimensões econômica, social e ambiental.
Jaques Wagner acredita que quando a pessoa tem a oportunidade de levar a vida de forma mais sustentável, geralmente, ela abraça a ideia. Ele contou que, durante uma campanha eleitoral, questionou um lenhador que cortava uma árvore no interior da Bahia se aquilo não o maltratava, ele respondeu que sim, mas o que mais o maltratava era não levar a comida dos filhos para casa.
“A miséria não é sustentável, a usura também não é. PIB (Produto Interno Bruto) lá em cima, mas, ao mesmo tempo, um índice de Gini que reflete um não equilíbrio e uma não distribuição de renda. Uma hora a panela de pressão vai arrebentar. Nós temos de chegar a um grau de equilíbrio nessa equação para que possamos ter sustentabilidade. É por isso que eu insisto que a questão da distribuição de renda é o pilar para a sustentabilidade” destacou o senador.
Desigualdade social cresce no Brasil, segundo IBGE
Dados divulgados nesta quarta-feira (06) pelo IBGE apontam que, em média, 1 milhão de brasileiros, por ano, desceu abaixo da linha de pobreza entre os anos de 2015 e 2018, chegando a atingir 6,5% da população. Isso quer dizer que 13,5 milhões de pessoas no Brasil vivem com rendimento inferior a US$ 1,90 (cerca de R$ 7,60) por dia, um contingente superior à população total de países como Bolívia, Bélgica, Cuba, Grécia e Portugal.
Além disso, a desigualdade de rendimentos alcançou o maior índice da série histórica da Síntese de Indicadores Sociais, iniciada em 2012 pelo IBGE. Os dados revelaram que, no ano passado, o rendimento dos 10% mais ricos foi 13 vezes maior do que o dos 40% mais pobres.
América Latina e Caribe: a região mais desigual do planeta
Carlos Mussi, diretor da Cepal no Brasil, mostrou, durante o seminário, que as economias no mundo inteiro têm crescido menos nos últimos anos e a América Latina se coloca como a região onde a desigualdade social é a maior do planeta. “É preciso executar modelos de desenvolvimento e suas estratégias a longo prazo e por setor. A América Latina, por exemplo, governa muitos recursos naturais e o Brasil é um grande provedor de alimentos para o resto do mundo. Um novo modelo de desenvolvimento é necessário”, observou.
Desenvolvimento X Sustentabilidade
Já Luiz de Mello, diretor de economia da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), defende que a “sustentabilidade do meio ambiente passa pela inovação tecnológica e pela adoção de novas tecnologias”.
Indicadores da OCDE mostram o Brasil e o México como os países com menor rigidez nas regulações ambientais, com 0,5 e 0,7 pontos, respectivamente. França e Alemanha, por exemplo, superam o índice de 3,5. Mello salientou que as pessoas ainda pensam que padrões ambientais mais exigentes são um luxo e que para se desenvolver, os países não devem considerar a sustentabilidade como prioridade. “Quando maior o desemprego, menor a preocupação com o meio ambiente. Ainda há uma percepção de que o progresso econômico e a preservação do meio ambiente são incompatíveis”, lamentou.
Mas a experiência de um país vizinho mostrou que é possível. Em 15 anos, o Uruguai passou de importador para exportador de energia elétrica, ao mesmo tempo em que vem assegurando o acesso da maioria de sua população a esse serviço com significativa ampliação de fontes renováveis e não-poluentes: eólica, solar e biomassa. Hoje elas respondem por 98% da geração de energia elétrica no país, que antes era predominantemente oriunda do petróleo e de hidrelétricas.
“Os formuladores brasileiros de políticas públicas precisam se espelhar nas experiências exitosas de um desenvolvimento sustentável e adotar projetos semelhantes. Algumas das sugestões dos especialistas ao Estado brasileiro já estão sendo executadas, mas o resultado tem sido insignificante, pois pressupõem que os empresários alterem seu modelo de produção. Por exemplo, a agricultura de baixo carbono e sustentável implica que o produtor transite entre a cultura do agrotóxico para um modelo agroecológico”, comentou Edélcio Vigna, assessor da Unicopas.
O seminário foi promovido pela subcomissão do Grande Impulso para a Sustentabilidade, ligada à Comissão de Meio Ambiente (CMA).
Objetivos de desenvolvimento sustentável para superação das desigualdades
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e a Agenda 2030 das Nações Unidas, bem como o Acordo de Paris foram apresentados como consensos mundiais quando o assunto é a busca pela sustentabilidade. Em 2015, liderem mundiais, inclusive do Brasil, definiram um plano de ação para erradicar a pobreza, proteger o planeta e garantir que as pessoas alcancem a paz e a prosperidade.
São 17 objetivos que congregam mais de 200 metas, uma ambiciosa lista de tarefas para todas as pessoas, em todas as partes, a serem cumpridas até 2030. Se cumprirmos essas metas, seremos a primeira geração a erradicar a pobreza extrema e iremos poupar as gerações futuras dos piores efeitos adversos da mudança do clima.
Diversas ações e projetos são desenvolvidos em todo o mundo tendo como guia os ODS. A Unicopas (União Nacional das Organizações Cooperativistas Solidárias), desde o ano passado, executa um projeto financiado pela União Europeia que tem como eixo principal a promoção e o fortalecimento do cooperativismo e da economia solidária no Brasil. A Unicopas acredita que essas são estratégias fundamentais para o alcance dos ODS e consequente desenvolvimento sustentável.
“O cooperativismo e a economia solidária surgem como alternativas ao desemprego e geração de renda, em especial, às populações mais empobrecidas. Atua diretamente na promoção do acesso aos direitos iguais aos recursos econômicos e na criação de marcos políticos sólidos, com base em estratégias de desenvolvimento para as populações mais vulneráveis economicamente”, explicou Arildo Lopes, presidente da Unicopas.
Mundialmente, três milhões de cooperativas contribuem significamente com o crescimento econômico, com geração de empregos estáveis e de qualidade, de acordo com a ACI (Aliança Cooperativa Internacional). São mais de 280 milhões de pessoas em todo o mundo trabalhando em cooperativas, o que representa 10% da população empregada. Além disso, as 300 maiores cooperativas do mundo geram US$ 2,1 bilhões de dólares ao mesmo tempo em que proporcionam os serviços e a infraestrutura que a sociedade necessita para prosperar. No Brasil, há mais de 6,8 mil cooperativas distribuídas em 13 ramos de atividades, ultrapassando 14,2 milhões de associados e gerando 398 mil empregos formais, segundo dados da Agenda Institucional do Cooperativismo 2019.
Mas esses números podem ser ainda maiores, conforme Lopes. Isso porque o cooperativismo é uma das formas associativas de organização do trabalho, que também pode ser encontrada em associações produtivas e empresas de autogestão.