Claudete Costa, 43 anos, presidenta da Unicopas (União Nacional das Organizações Cooperativistas Solidárias), é uma das crianças sobreviventes da Chacina da Candelária. O crime ocorreu há 30 anos, na madrugada de 23 de julho de 1993. Naquele dia, oito crianças e adolescentes foram executados por policiais enquanto dormiam em frente à Igreja da Candelária, no centro do Rio de Janeiro.
Na época, Claudete tinha apenas 13 anos e estava com a família. Ela conta que só não foi atingida naquela noite porque a mãe a colocou de castigo e por isso teve que separar materiais recicláveis na cooperativa próxima ao local do massacre. “Eram todos meus amigos, brincávamos na Candelária todos os dias. Eu era uma menina e já tinha um histórico de violência com meus pais. Perder amigos assassinados de forma tão brutal foi muito triste, muito pesado”, relembra.
O extermínio de crianças e adolescentes na Candelária teve repercussão internacional, chegou a entrar no calendário como um dos piores crimes cometidos contra os Direitos Humanos. Na época, o Brasil ainda passava pelo processo de redemocratização e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) acabava de ser criado, em 1990.
Carlos Nicodemos, membro do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) e integrante do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), destaca que a chacina da Candelária apontou um contraste estrutural em relação à lei e à realidade.
“O que ocorreu foi o descortinar daquilo que estava sendo denunciado em CPI Federal e Estadual que já apontava esses grupos de extermínio. Acreditava-se que com a edição das leis, convenção e o ECA pudéssemos superar essa questão, coisa que não aconteceu naquele momento e nem mesmo hoje”, explica Carlos Nicodemos.
Crimes contra pessoas inocentes
A violência contra inocentes ainda é uma realidade presente na vida de muitos brasileiros. Claudete Costa conta que presencia diversos tipos de situações na comunidade em que mora no Rio de Janeiro e enfatiza: “sou uma sobrevivente da própria sociedade. É triste ver que moramos em um país que a gente sofre de tudo, principalmente, quando se é negro, pobre, periférico e está na vulnerabilidade. O sofrimento parece que é ainda maior”.
De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública e o Unicef, de 2016 a 2020, 35 mil crianças e adolescentes foram assassinados no Brasil, uma média de 7 mil por ano, sendo meninos negros as principais vítimas de mortes violentas.
Para o representante do CNDH, é necessário implantar um plano nacional que possa fazer uma ampla mobilização da sociedade civil e dos movimentos sociais. “Precisamos pensar que este plano não pode se resumir a um conceito de representatividade das organizações, mas no diálogo com a sociedade para levantar elementos chave para uma mudança cultural, normativa e programática”, pontua.
Oportunidades por mais dignidade
Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em 2022 a população de rua superou as 281 mil pessoas no Brasil, a Região Sudeste concentra pouco mais da metade do público, com 151 mil pessoas.
Para sair das ruas e garantir o próprio sustento, Claudete Costa acreditou na reciclagem de materiais recicláveis. Catadora desde os 10 anos, Claudete foi agregando valor ao trabalho e atualmente é dirigente da Unicatadores, atuante no Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR) e presidenta da Unicopas.
“Sou catadora até hoje, pretendo estar em outras profissões e ser um exemplo de luta para outras mulheres, crianças e adolescentes. A reciclagem pra mim é um estímulo, é minha profissão e tenho orgulho de passar o que sei para novas gerações, principalmente, mulheres e jovens”.
A Unicopas atua no campo e na cidade, promovendo o cooperativismo e a Economia Solidária, incidindo sobre políticas públicas, entre as mulheres e os jovens, pelos direitos humanos e em prol dos Objetivos dos Desenvolvimento Sustentável.
“Somos quatro centrais com potencial de representatividade em todos os setores do cooperativismo solidário com inclusão para gerar trabalho e renda com dignidade e oportunidade para todos que querem ter um futuro com qualidade de vida”, conclui Claudete Costa.