‘Economia solidária é farol na transformação social’, afirma Gilberto Carvalho

Secretário de Economia Solidária, Gilberto Carvalho relatou experiência brasileira no Fórum da Asett. Foto: Tatiana Carlotti

O secretário de Economia Solidária do governo Lula, Gilberto Carvalho, levou a experiência do Brasil ao 1º. Fórum de Economia Social da Asett, ocorrido entre 29 e 30 de maio, no País Basco. Ao lado de autoridades de diversos países, como Espanha, França, Congo, Senegal e México, ele apresentou um histórico da economia social, aqui chamada de economia solidária.

Carvalho defendeu que a economia solidária “não pode estar afastada do processo de mudança efetiva e civilizatória do país”. Ela tem de ser um “farol a nos ajudar a operar a transformação social”, afirmou.

Durante sua fala, Carvalho destacou as heranças corporativistas trazidas pelos imigrantes europeus ao Brasil, como uma “solução que os camponeses encontraram para melhorar as suas vidas e conseguir fazer compras de insumos e a venda melhor dos seus produtos”. Ao longo do tempo, essas cooperativas se transformaram em grandes empresas dando origem ao que chamamos de “cooperativismo empresarial”.

Nossa primeira lei sobre cooperativismo data de 1971, quando ainda estávamos sob a ditadura militar (1964-1985). “Ela teve uma importância fortíssima na questão do agronegócio”, que representa parte importante do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Contudo, o corporativismo empresarial, ao contrário da economia solidária, “não é um sistema cooperativo que atende as necessidades de mudanças sociais no país”, ponderou.

“A economia solidária teve início nos anos 1990, quando o Brasil passou por um processo fortíssimo de desemprego, com a indústria da automação e a reforma do mundo do trabalho, e se construíram as bases de um grande movimento social”, relatou Carvalho.

Lei Paul Singer

A partir de 2003, o governo brasileiro criou a Secretaria Especial da Economia Solidária, dentro do Ministério do Trabalho, e começou a desenvolver uma legislação própria voltada a atender as demandas do cooperativismo solidário. “Foi uma luta, porque no Brasil tudo o que é para os trabalhadores é uma luta. Essa lei, denominada Lei Paul Singer, demorou 12 anos no Parlamento e, finalmente, conseguimos, em dezembro de 2024, aprová-la”, destacou.

A legislação leva o nome do sociólogo Paul Singer, pois foi um dos grandes impulsionadores deste outro modelo econômico em nosso país e que cunhou o termo “economia solidária”.

Hoje, existem no país 28 mil iniciativas, em torno de 15 mil informais e 13 mil formalizadas sob a forma de cooperativas. A lei reconhece o empreendimento econômico solidário, abrangendo cooperativas e associações informais de economia social. Ela tem como princípios “o desenvolvimento sustentável, agroecológico e do comércio justo, com foco na valorização do trabalho decente”, afirmou.

“A Lei Paul Singer estabelece um sistema nacional de economia solidária que trabalhe a formação de redes entre das cooperativas, a formação de um sistema de crédito em torno de mais de 250 bancos comunitários e a busca de tecnologias sociais, com formação técnica social e pesquisas”, relatou. Além disso, ela impulsiona a integração territorial, na medida em que a cooperativa desenvolve o território.

Desenvolvimento local

O Fórum da Asett abriu um importante espaço para que as administrações municipais brasileiras, como a prefeitura de Maricá, pudessem acessar outras experiências globais de economia solidária. Matheus Gaúcho, secretário de Economia Solidária e Empreendedorismo Social do município, destacou a importância do encontro.

“Maricá investe muito em economia solidária no governo do prefeito Washington Quaquá, que é a economia voltada às pessoas e famílias, e um eterno aprendizado para todos nós. Estamos aqui para conhecer as políticas internacionais e quem já faz esse grande trabalho. É um Fórum de extrema importância para aprendermos mais sobre economia solidária, colocando-a em prática e acrescentando ao que já desenvolvemos na nossa amada Maricá”, afirmou.

Além do Brasil, outros países do Sul Global marcaram presença no encontro, com a participação de cooperativas e empresas familiares, ministros e secretários de Estado de países africanos, como Senegal e do Congo, e dos latino-americanos México, Chile e Brasil.

A experiência do Senegal

Dione Aliou, ministro de Microfinanças e Economia Social e Solidária do Senegal, governado desde março de 2024 por Bassirou Faye, comemorou o fato do país ser o primeiro na África a ter “um Ministério plenamente ligado à economia solidária”.

“O Senegal tem um lugar específico no governo voltado à economia solidária”, destacou Aliou ao apontar os esforços do governo Faye na luta contra a pobreza, que duplicou durante o governo antecessor de Macky Sall. Ele mencionou o alto desemprego entre os senegaleses, responsável pelo aumento de imigrantes do país à Espanha.

Destacando a clivagem ideológica, entre liberalismo e socialismo, da economia social, Aliou apontou que a economia popular não pode ser estigmatizada. “O que está em jogo é o desenvolvimento humano global a partir de políticas centradas no desenvolvimento das comunidades”, afirmou, destacando suas imensas possibilidades, em particular, a dimensão da solidariedade, cooperação, governança democrática e responsabilidade social de suas práticas.

Em sua visão, o desafio da economia solidária é conciliar a inovação social com a economia do lucro. Ele também apresentou uma série de medidas governamentais “para todos os que se comprometam a respeitar os princípios da colaboração conjunta” no Senegal.

O país africano vem realizando um esforço de sistematização de suas cooperativas e utilizando a economia solidária para “empregar as pessoas, de forma massiva, a partir das cooperativas agrícolas e cooperativas produtivas solidárias”. Segundo Aliou, o país está fazendo uma “revolução econômica” ao relatar o projeto em curso de impulsionar dez mil cooperativas no país para contribuir com o serviço público, a partir de conhecimento tecnológico, formação de pessoas e apoio do governo na redução dos custos de produção.

Avanços no México

Outra experiência relatada, de grande impacto, vem do México. A delegação mexicana exortou os esforços do governo de Claudia Sheinbaum na promoção da economia solidária. Em sua fala, o senador mexicano Emmanuel Reyes contou as reformas em curso no seu país.

“É importantíssimo reconhecer os esforços do governo mexicano para levar novas sociedades cooperativas, principalmente de trabalho e crédito, que vem começando uma nova etapa de reformas com a chegada da presidenta do México, Claudia Sheinbaum”, apontou.

Entre as medidas, ele mencionou a lei que considera as sociedades associativas, um total de 18 mil entidades, “entes que prestam serviços ao governo mexicano”. Através da economia social, a gestão Sheinbaum pretende “potencializar as regiões econômicas do país, os polos de desenvolvimento e a implementação de parques industriais”.

Reyes também anunciou que neste ano de 2025, comemorado como o ano do cooperativismo, o México tornará  suas cooperativas um patrimônio cultural, com vários eventos, incluindo uma grande premiação entre suas cooperativas para dar visibilidade às iniciativas de economia solidária.

Leia a primeira reportagem da série: Economia solidária se articula contra a barbárie neoliberal.

Fonte: https://operamundi.uol.com.br