Uso excessivo de agrotóxicos na contramão do desenvolvimento sustentável

Em oposição ao Pacote do Veneno, Projeto de Lei em tramitação no Congresso Nacional que institui a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos é fundamental para um desenvolvimento com sustentabilidade

Dados do Censo Agropecuário 2017 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostraram que, nos últimos 11 anos, o número de estabelecimentos que admitiram usar agrotóxicos aumentou 20,4%. Realidade nada animadora quando observado, neste ano, o número recorde de liberações de pesticidas por parte do Governo Federal que, até novembro de 2019, chegou ao total de 439 registros.

Conhecido como forte aliado no aumento da produção agrícola, o uso excessivo de agroquímicos podem trazer danos irreversíveis para a sociedade. Muitos dos pesticidas liberados são considerados altamente tóxicos e mais de 30% já são proibidos na União Europeia. O Brasil é campeão no uso de pesticidas na agricultura no mundo. De 2007 a 2017, data do último levantamento oficial, foram notificados cerca de 40 mil casos de intoxicação aguda por causa deles. Quase 1.900 pessoas morreram.

Já conforme o Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA) da Anvisa, um terço dos alimentos consumidos pelos brasileiros está contaminado, segundo análises de amostras coletadas em todos os 26 estados do país. Os altos índices trazem malefícios para a saúde, como mostra o Dossiê dos Agrotóxicos elaborado pela Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva). De acordo com o documento, “o uso de um ou mais agrotóxicos em culturas para as quais eles não estão autorizados, sobretudo daqueles em fase de reavaliação ou de descontinuidade programada devido à sua alta toxicidade, apresenta consequências negativas na saúde humana e ambiental, causando problemas neurológicos, reprodutivos, de desregulação hormonal e até câncer”.

Além de ser altamente prejudicial à saúde, o uso de agrotóxicos tem cerceado o direito de escolha de centenas de agricultoras e agricultores. Muitos que desejam fazer a transição para a produção orgânica não conseguem simplesmente porque têm as lavouras contaminadas por meio de pulverização aérea das plantações vizinhas.

Política Nacional de Redução de Agrotóxicos

Em tramitação no Congresso Nacional, o Projeto de Lei (PL) 6.670/2016 é fruto de forte incidência e mobilização da sociedade civil organizada para a instituição da Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA). O PL, apoiado e acompanhado também pela Unicopas (União Nacional das Organizações Cooperativistas Solidárias), é contrário ao PL 6.299/2002, mais conhecido como Pacote do Veneno, cujo objetivo principal é flexibilizar as leis de agrotóxicos no Brasil. Em dezembro de 2018, a PNARA foi aprovada na Comissão Especial da Câmara Federal e atualmente se encontra pronta para votação em plenário, assim como o Pacote do Veneno.

Enquanto o Governo Federal intensifica e estimula o uso de agrotóxicos no Brasil, alguns estados e municípios tentam atuar de outra forma. Um exemplo é o caso do Ceará que, por meio de alteração na Lei 12.228/1993, proibiu a pulverização aérea no estado e ainda prevê aplicação de multa no valor de R$ 15 mil. Projeto semelhante já havia sido aprovado em alguns municípios, como Glória de Dourados, no Mato Grosso do Sul, Nova Venécia e Boa Esperança, ambos no Espírito Santo. No Paraná, atualmente, tramita proposta como mesmo teor. Outra iniciativa exemplar ocorreu em Santa Catarina, onde Florianópolis foi considerada zona livre de agrotóxicos. A Lei 10.628/2019 proíbe o “uso e o armazenamento de agrotóxicos, sob qualquer tipo de mecanismo ou técnico de aplicação (…) na parte que pertence a ilha”. A Lei ainda precisa de regulamentação.

Outra boa notícia é que neste mês, a 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Fortaleza suspendeu a liberação de 63 novos agrotóxicos no país. O juiz Luis Praxedes Vieira da Silva alertou que produtos considerados altamente tóxicos e perigosos ao meio ambiente receberam o aval do Executivo para a livre comercialização no país. Segundo ele, esse tipo de ação do governo “malfere os princípios constitucionais do poder dever de assegurar o meio ambiente ecologicamente equilibrado para gerações presentes e futuras”.

Por que o Brasil precisa reduzir o uso de agrotóxicos?

O cenário comprova que uma agricultura pautada no uso excessivo de pesticidas, além de prejudicar a saúde das pessoas, com degradação do solo e contaminação das águas, vai de encontro aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), estabelecido pelas Nações Unidas em 2015. São 17 objetivos que congregam mais de 200 metas, uma ambiciosa lista de tarefas para todas as pessoas, em todas as partes, a serem cumpridas até 2030. Esta é a base da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.

Investir em modelos de produção e transição agroecológicas é essencial para que o Brasil atinja os ODS e consiga crescer com sustentabilidade. A agricultura familiar, por exemplo, que garante boa parte da produção de alimentos livre de agrotóxicos e é responsável pela maioria da comida que chega até as mesas dos brasileiros, é um dos caminhos para a produção e o desenvolvimento sustentáveis.  

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